Por que usar leveduras líquidas?

Um pergunta natural que surge ao se trabalhar com leveduras líquidas é: Elas realmente são tão melhores que as leveduras secas (ou em pó ou liofilizadas)?

Quando usamos o adjetivo “melhor” temos de definir o “melhor  em que ?”

Em qualidade de produto são similares. As marcas de fermento em pó mais conhecidas e que encontramos no Brasil são a Fermentis e a Lallemand (Danstar). A Fermentis, do grupo Lasaffre com mais de 10 fábricas ao redor do mundo,  mais conhecida no Brasil porque chegou primeiro. Posteriormente a canadense Lallemand ( que produz o famoso Nottinghan), que para quem não sabe é a dona do renomadíssimo  Sibel Institute of Technology. Por tanto é inquestionável a qualidade destas leveduras. O processo de produção e a liofilização dos fermentos seguem padrões de qualidade altíssimos.

Lembram-se do episódio envolvendo o fermento Nottingahn? Quando um lote teve problema de envase? (Relembre o casoaqui). A postura imediata do Lallemand foi enviar e-mails a todos os distribuidores, e repor os fermentos. Isso no mundo todo. Isso é reflexo da seriedade de empresa.

O mesmo podemos afirmar sobre a White Labs(WLP) e a Wyeast. De qualidade irrefutável.

 Mas então…onde esta a diferença? Porque fermento líquido é a menina dos olhos de cervejeiros?

 Esta na variedade.  Liofilização de fermento é um processo caro, porém com esta técnica é possível aumentar o tempo de prateleira (shelf life) dos fermentos e distrui-los ao redor do mundo sem muitos cuidados de armazenamento e transporte. A liofilização também torna o fermento seco prático e rápido de ser usado. Dado isso as empresas optam em liofilizar apenas algumas cepas mais “comuns” e coringas.  A Fermentis com  6 cepas e a Lallemand 6, também.

Mas é possível fazer qualquer estilo de cerveja com estes fermentos?

A resposta seria um semi-sim.  Fazendo algumas adaptações é possível sim. Lembro do último concurso estadual da Acerva Paulista cujo estilo foi tripel e muito gente “brincou” com a temperatura de fermentação destes fermentos secos afim de obter a característica frutada que o estilo pede.  Porém estas artemanhas não funcionam tão perfeitamente quanto gostaríamos.  Aumentar a temperatura de fermentação, por exemplo, para forçar a formação de ésteres ( que dariam o frutado) também forçam a formação de álcoois superiores que as vezes ( e dependente da temperatura) resultam em aromas de álcool rascante para nosso paladar. Fora a formação acentuada de acetaldeído (famosa maça-verde), totalmente indesejado.  Outro ponto é que quando falamos em éster, não falamos em um tipo específico de éster. Ésteres são famílias, existem vários tipos e surgem das mais variadas formas (nao só com variação de temperatura), como pode ser visto na tabela I.

Fórmula

Aroma/sabor

C3H7 – COO – C2H5

abacaxi

Formato de isobutila

H – COO – C4H9

framboesa

H – COO – C2H5

pêssego

C3H7 – COO – C5H11

abricó

CH3 – COO – C5H11

pêra

Etanoato de octila

CH3 – COO – C8H17

laranja

Etanoato de benzila

CH3 – COO – CH2 – C6H5

gardênia

CH3 – COO – C5H11

banana

C6H13 – COO – C2H5

vinho

CH3 – COO – C2H5

maçã

Nonilato de etila

C8H17 – COO – C2H5

rosa

Antranilato de metila

H2N – C4H6 – COO – CH3

jasmim

C5H11 – COO – C2H5

pinha

CH3 – COO – C2H5

menta

C3H7 – COO – C4H9

damasco

Etanoato de isobutila

CH3 – COO -C4H9

morango

E este é, um,  do exemplos que nos leva às leveduras líquidas…. apesar de falarmos o tempo todo em saccharomyces cerevisiae (para ales) cada cepa, tem características próprias. A grosso modo seria como compararmos a seres humanos, uns com olhos claros, outro negros, com cabelo crespo ou cacheados.  Uns tomam Brahma outros Leite. Cada um se caracteriza de uma forma muito específica. Mas todos são seres humanos E ai que mora a beleza em se usar leveduras líquidas.

As características especificas de certos estilos de cervejas (para as que estão relacionadas principalmente a carecteristicas de fermentação) são sobressaltados ou mais evidenciados em leveduras especificas para aquele estilo. Um tripel feita com o fermento líquido correto resultará em um éster muito característico e não o que se obtém brincando com a temperatura de fermentação (no caso de fermentos secos). E outra analogia que podemos fazer seria:

 
Você tem um belo carro, esportivo, V8 com 32 válvulas. Movido a gasolina. Ao abastece-lo você tem 3 opções: gasolina comum, gasolina aditiva e gasolina com alta octanagem. Você pode por qualquer gasolina. Seu carro ainda será um belo carro e chamará muito a atenção. No dia-a-dia você usa a aditivada. Mas se você quiser mesmo por a prova todo o desempenho do seu possante você terá de usar gasolina com alta octanagem, mais cara, mas que proporcionará uma performance inesquecível.
 
Neste caso, o carro é a cerveja e a gasolina o fermento.
 
Porém, como sempre falamos, cerveja é cozinha. Cada um vai defender com unhas e dentes seus métodos e práticas. Sabemos que fermentos secos são mais práticos, baratos e rápidos de serem usados do que os fermentos líquidos… Mas uma coisa é certa:
“Você fará cervejas excelentes com fermentos secos. Mas você fará cervejas inesquecíveis com fermentos líquidos.”

David - Lamas Autor

David Figueira, doutor em Física pela UNICAMP e fundador da Lamas Brew Shop e da Cervejaria Cogumelo.

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